RESENHA - Michel MAFFESOLI – Elogio da razão sensível

RESENHA - Capítulo VI – A experiência. 1 – O senso comum. 2 – A Vivência  pp.161-183. In: MAFFESOLI, Michel – Elogio da razão sensível. Trad. Albert Christofhe Migueis Stuckenbruck. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.


 

Laura Meireles Gomes Moura[1]


1 – O senso comum

Neste capítulo Maffesoli aborda os caminhos de aproximação e distanciamento entre o discurso especializado e o senso comum passando por todas as paisagens de sedimentação de conceitos corretivos e da fragilidade da legitimação desse último, destituído assim, de um valor em si mesmo para ser questionado e validado. A validação do discurso especializado  pelo “corte epistemológico” é a questão   posta neste capítulo.
Maffesoli considera a intuição e o uso da metáfora como expressões do senso comum e ata-os ao patamar da legitimidade pura, visão que se prende claramente àquilo que lhe confere e importa à vida, na proximidade da construção dela própria sem se ater a moldes do sistema teórico.
A mitologia  é utilizada  com o recorte do mito de Dionísio, ao tratar o saber também por esse olhar – o saber enraizado da divindade arbustiva de Dionísio, o mesmo que M. Weber chama de emocional ou afetual, próprio à comunidade, o que nos faz compreender a integração entre saber orgânico-corporal e o saber social. Assim sendo, são considerados simultaneamente importantes os dados profundos e de superfície que permeiam a cultura como fundamentos da ordem grupal.                          Maffesoli, também salienta que o racionalismo empenhou-se em passar a borracha em tudo que era da ordem do sentimento comum, fazendo dessa concepção um encontro com a metodologia de construção do conhecimento científico.
Portanto, o ponto de partida  de Maffesoli é a  “representação compreensiva”  de Nietzsche que  denomina “enraizamento dinâmico”, advindo do substrato construído de geração em geração e que lembra os vínculos de passado e futuro, provenientes dos enraizamentos da reflexão conferindo já, uma dinâmica do sensível na evolução social.
Ao passar por vários pontos de referências filosóficas nesse sentido, a valorização do ordinário, da sabedoria popular, associam-se ao simbolismo da árvore que se expande e eleva o senso comum à expressão de presenteísmo que serve de pivô entre passado e futuro e de toda a carga simbólica dos arquétipos – regime diurno e noturno que nas raízes da antropologia alimentam, pelos caminhos da seiva, essa árvore assegurando-lhe um crescimento natural que oferece os frutos do comunitário. Dessa forma é acentuado  que o que precede  a qualquer racionalização é a vivência comum que pode tomar formas diversas, mas que, nem por isso, exprime menos extraordinariamente o querer viver que constitui a sociedade.

2 – A Vivência

Ao ligar a vivência, a experiência sensível a laços importantes e significativos do saber, quebra-se aqui os conceitos preestabelecidos que compartimentam o saber e a reflexão e deles desvinculam a experiência sensível, como não pertencente às bases racionais.
Maffesoli propõe a ênfase da vicência cotidiana e da sabedoria popular, fundamentos da sociologia, como forma de reformulá-la atribuindo-lhe a denominação de “sociosofia” como forma de integrar e compreender a “mística do estar junto” explicando as agregações sociais não pela visão racionalista, mas pelos vínculos e as relações de pertença. Utiliza-se da “fórmula” de Fernando Pessoa: “Uns governam o mundo, outros são o mundo” como forma de propor a “centralidade subterrânea” determinando a socialidade e não as formas econômico-políticas como determinantes da vida social.
O teórico outras formas de pensar o vínculo social fora das grandes categorias que marcaram a modernidade: História e a Crítica, passa a ofertar a vivência um outro patamar cujo foco é o cotidiano envolto pelas paixões e os afetos que Bergson denomina de “duração” – pequenos “instantes eternos” que impregnados de significações passam da efemeridade do momento para momentos perduráveis em sua globalidade.
Um aspecto importante é a cientificação do estudo da cultura que quando se torna essencialmente normativo perde a essência principal, atribuindo ao fetichismo  para perceber o que há de vivo na cultura delegando desta forma, a inteligência aos locais de confinamento desta: as universidades, os centros de pesquisa, cada vez mais distantes da vida real.Estes sistemas explicativos e normativos – universalismos abstratos tendem a explicar todos os acontecimentos submetendo a existências às teorias que entendem explicá-la permanecendo fechada numa circularidade.Porém, é necessário para entender um novo estado de coisas, deitar fora as velhas ideias que prevaleceram até então, pois são dogmáticas, percebendo a especificidade e dirigindo-se para a vivência daqueles que são seus protagonistas, do que as teorias codificadas que já indicam o que esse fenômeno é ou deve ser encontrando explicações causais, para coisas humanas, mas, sobretudo compreendê-las.
A separação entre a objetividade e o entusiasmo já é posta entre a ciência e as obras de ficção numa modernidade ofuscada pelo saber científico e técnico, deixando clarear-se a visão quando se constata empiricamente que o sentimento comum, quer no júbilo ou na crueldade, é o que importam – experimentar, juntos, emoções comuns. Assim fazendo, incorporamos o mundo, e nos incorporamos ao mundo. E isso, no sentido mais simples, tornando-nos um corpo global, um corpo social, isto é, um corpo animado. Um corpo construído a partir da união dos contrários, um corpo que alia, ao mesmo tempo, o material e o espiritual, o sensível e o inelegível. Um corpo social que repousa antes demais nada sobre a colocação dos corpos individuais em relação, e, igualmente sobre o fato de que esta colocação dos corpos em relação secreta uma aura específica, um imaginário específico que é o cimento essencial de toda vida em sociedade.



[1] Mestranda em Patrimônio Cultural e Sociedade - UNIVILLE
 

Síntese Crítica Cap. II O que é Arqueologia. In: ARQUEOLOGIA de Pedro Paulo Funari




Karla Adriana Nascimento Cunico[1]

FUNARI, Pedro Paulo. ARQUEOLOGIA. São Paulo: Ática 1988.

2. O que é a Arqueologia

Delimitação de um campo de pesquisa

            Delimitar o campo de atuação da Arqueologia não é uma tarefa simples, entre os próprios profissionais da disciplina não há consenso, pois esta ciência encontra-se em plena construção. Para Funari (p. 09), “a Arqueologia estuda os sistemas socioculturais, sua estrutura, funcionamento e transformações com o decorrer do tempo, a partir da totalidade material transformada e consumida pela sociedade”. A partir deste conceito partem-se várias discussões, o autor (p. 09) levanta três questões que ao serem respondidas podem delimitar esta ciência:  

          O que estuda a Arqueologia?     
          O que visa a Arqueologia?       
          Qual sua relação com outras ciências sociais?

          O autor retrata a visão tradicional, amplamente difundia entre os próprios arqueólogos, de que o objeto de estudos da arqueologia se resume ao patrimônio material, que basicamente estes profissionais são responsáveis por “esburacamento do solo e a recuperação de objetos antigos” (p. 10). Funari não concorda com esta visão e afirma que “não há uma oposição entre os dois níveis que justifique o estudo apenas das coisas: a cultura refere-se, a um só tempo, ao mundo material e espiritual” (p. 10). Ele ressalta que ultimamente esta ciência tem “alargado seu campo de ação para a cultura material de qualquer época, passado ou presente” (p. 10).
Sobre o objeto de estudo da Arqueologia, Funari (p. 11) conclui que “a Arqueologia estuda, diretamente, a totalidade material apropriada pelas sociedades humanas, como parte de uma cultura total, material e imaterial, sem limitações de caráter cronológico”.
            Quanto à questão: o que visa a Arqueologia? O autor diz “a Arqueologia, partindo dos elementos materiais apropriados pelo homem, visa à compreensão do funcionamento e transformação das sociedades humanas” (p. 12).
            Já o tópico sobre as suas relações com as outras ciências humanas, é complexo e se consolidou como embate entre pesquisadores e profissionais da própria arqueologia com outros da história e da antropologia. De um lado, estão os que afirmam que a Arqueologia é uma disciplina auxiliar que encontra e cataloga objetos materiais oriundos de escavações, de outro se encontram arqueólogos com uma visão mais abrangente daquela ciência “enquanto estudo da porção da cultura material, possui uma práxis e uma reflexão metodológicas próprias, ambas em construções, e cujas características, ainda embrionárias, justificam sua qualificação como projeto de ciência da cultura material” (p. 16).

O cotidiano: o contexto cultural da atividade humana

Neste tópico o autor levanta um importante questionamento, a análise dos objetos materiais sem que seja levado em conta o contexto cultural da sociedade que o criou. Há uma “fetichização dos artefatos, que parecem adquirir independência de seus produtores e usuários” (p. 17). Em contrapartida, “ocorre uma humanização do universo material, ocorre uma reificação (coisificação) das relações sociais, uma alienação da vida social na esfera natural” (p. 17). Funari resume esta importante questão tratando-a como um “paradoxo: que as relações sociais sejam tomadas como fazendo parte da esfera natural e os artefatos, em oposição, adquiram uma trajetória autônoma” (p. 17).

Com o que se depara o arqueólogo: o contexto arqueológico

            Funari, diz que basicamente o arqueólogo trabalha com escavações e que os objetos normalmente encontram-se “mutilados e deslocados do seu local de utilização original” (p. 22). Para tratar do contexto arqueológico, o autor faz uma importante observação ao afirmar que “a Arqueologia nada mais é que uma leitura, um tipo particular de leitura, na medida em que seu texto não é composto de palavras mas de objetos concretos” (p. 22). Neste ponto a ênfase é para a dificuldade desta leitura, “a (in) traduzibilidade do texto arqueológico” (p. 22). Para auxiliar tal leitura há uma

preocupação crescente com a interdisciplinaridade, buscando-se um intercâmbio, quanto ao modo de leitura, com campos de atuação paralelos e complementares. Isto é particularmente válido no que diz respeito à Semiótica, preocupada com os princípios teóricos da comunicação – e, portanto, com a leitura em geral –, mas atinge já outros tipos de leitura, aparentemente distantes da Arqueologia, como a Psicanálise (p. 22).

Os artefatos, índices e mediadores

            Funari reafirma que os artefatos de determinada sociedade remetem as relações socioculturais desta, eles são “sempre índice das relações sociais nas quais foi produzido e apropriado” (p. 22). Tais artefatos (ou indícios) podem ser interpretados já que são “produto do trabalho humano, e, portanto, apresentarem necessariamente duas facetas: têm uma função primária (uma utilidade prática) e funções secundárias (empregos secundários)” (p. 23). Além disso, ele “exerce uma mediação nessas relações, atuando como direcionador de atividades humanas” (p.23).
            Cada sistema social tem seu próprio “universo material” (p. 24), os objetos são usados pelos humanos como auxiliares na divisão social, hierarquização e na consolidação da identidade cultural.

Os objetos arqueológicos na sociedade contemporânea

            Funari, faz uma reflexão sobre artefatos encontrados em escavações arqueológicas e que são (re)utilizados pela sociedade atual, como instrumentos ou como objetos de decoração. Ele cita ainda que “boa parte dos objetos, na medida que não possuem valor material ou cientifico, segundo os padrões sociais vigentes no memento da recuperação, é novamente desativada e transformada em lixo” (p. 24).
            Na mediada que acontece aquela reintegração de tais artefatos, esses “podem adquirir funções ideológicas, tanto no sentido de acobertamento de relações sociais passadas e na sua fetichização como, ao contrário, servindo de elemento de recuperação do passado para uma crítica do presente” (p. 24/25).

Considerações críticas

            Nesse capítulo da obra de Funari, dois tópicos se destacam, o primeiro é a afirmação que o autor faz sobre a “fetichização” dos artefatos, como se os objetos pertencentes a sociedades extintas tivessem vida própria e pudessem ser analisados fora do seu contexto cultural/social. O segundo,  aspecto a ser destacado é que o autor considera a Arqueologia uma linguagem, uma forma de ler o mundo, através da cultura material, assim realiza uma interseção entre a cultura material e sua relação de subjetividade com a sociedade a qual ela pertence.


[1] Mestranda em Patrimônio Cultural e Sociedade – Universidade da Região de Joinville


Resenha do Capítulo: O Mito In: Mitologias - Roland Barthes



Resenha Crítica
Autora da Resenha: 
MORAES RAUEN, Taiza Mara
Referência do Texto:
BARTHES, Roland.O mito, hoje. In: Mitologias .  Tradução Rita Buongermino e Pedro de Souza. 8 ed. Rio de Janeiro,Bertrand Brasil S. A.,  1989.p.131-178.

Palavras-chaves (3):
Mito; Literatura; Semiologia
Desenvolvimento do Texto:
 1-Introdução:
Roland  Barthes (França, 1915 - 1980) semiólogo e teórico da literatura, desenvolveu  em Mitologias  uma crítica ideológica e semiológica da linguagem da cultura de massa, operando reflexivamente sobre a naturalidade com que a imprensa, o senso comum e arte tratam a realidade mascarando-a ideologicamente. O mito é abordado como linguagem, pois ao enfocar o mito hoje, procura abordá-lo numa relação  triádica entre a natureza , a objetividade do cientista e a subjetividade do escritor

2 - Resumo:
O livro  Mitologias dividido em duas partes,  a primeira  “Mitologias”  é constituída por pequenos ensaios em que Barthes , se posiciona com mitólogo  buscando tratar da significação de mitos contemporâneos ao explorar cenas da vida cotidiana  francesa entre os anos de 1954 a 1956. Já, a segunda parte  “O mito , hoje” é subdividido em:  O mito é uma fala; O mito como sistema semiológico; A forma e o conceito; A significação; Leitura e decifração do mito; A burguesia como sociedade anônima; O mito é uma fala despolitizada; O mito na esquerda; O mito na direita; Necessidade e limites da mitologia – ensaios teóricos/reflexivos, nos quais são questionadas as relações entre natureza/história.

Aspectos abordados sobre o mito:
·         Conceituação de mito;
·         Relação mito/semiologia;
·         Mito no sistema semiológico;
·         Significação;
·         Relação mito/literatura.

O mito é uma fala – p131- 133

MITO = Sistema de comunicação historicamente determinado;
           = Uma fala que não se define pelo objeto de sua mensagem, mas pela maneira
               como  é  proferido;
           =  Tem  limites formais, mas não substanciais, portanto tudo pode mito porque  
               o universo é infinitamente sugestivo.

O mito como sistema semiológico  p. 133-139

p.133 “A semiologia é uma ciências das formas, visto que estuda as significações independentemente de seu conteúdo.”

p. 134-135 -Barthes, enfatiza que a fala mítica é formada por uma matéria já trabalhada, pois visa uma comunicação apropriada e  situa o mito numa relação de dependência a uma ciência geral extensiva à Linguística – SEMIOLOGIA = ciência das formas, estuda as significações independente de seu conteúdo.
A semiólogo explora o fato e defini-o como  um valor de equivalência, portanto a semiologia propõe uma relação  entre dois termos , significante e significado, objetos de ordem diferente e constitui uma equivalência. Na linguagem comum, o significante exprime o significado, já no sistema semiológico há três  termos diferentes, o que se apreende não é um termo após o outro, mas a correlação os une:  o significado, o significante e o signo, total associativo dos dois primeiros termos. O exemplo tomado é um ramo de rosas que é (re)significado em paixão, assim, nessa relação existe um significante, um significado, as rosas e a paixão, rosas “passionalizadas”, ou seja,  analiticamente as rosas carregadas de paixão podem ser decompostas em rosas  e em paixão e tinham uma existência independente antes de se transformarem em um signo da paixão. Assim, o significante é vazio e o signo é pleno, é um sentido.

p. 135-136 -  Diálogo – Barthes/Saussure/Freud/ Sartre:
Saussure – estudou um sistema semiológico específico, a língua,  e nesse sistema, significado = conceito; significante = imagem acústica e o signo= relação entre o conceito e a imagem.
Freud-  estudou  o psiquismo= espessura de equivalências, ou seja, um termo é constituído pelo sentido manifesto do comportamento, um outro pelo sentido latente ou próprio ( substrato de um sonho), terceiro termo é a correlação dos dois primeiros: “é o próprio sonho, na sua totalidade, o ato falho ou a neurose, concebidos como compromissos, economias realizadas graças à junção de uma forma ( primeiro termo) e de uma função intencional (segundo termo).”
Sonho ,não é o conteúdo manifesto nem o conteúdo latente, mas a ligação dos dois termos.
Sartre – propôs uma crítica, na qual,  o significado= crise original do sujeito ( separação da mãe para Baudelaire ); Literatura como discurso, forma o significante; e a crise com o discurso define a obra, gerando uma significação.
Daí: na semiologia o esquema tridimensional da forma é constante, mas não funciona sempre do mesmo modo; seu campo é a linguagem , portanto, sujeita a operação da leitura ou do deciframento.

p. 136-137  - MITO – esquema tridimensional – significante/significado e signo – sistema semiológico segundo
signo= totalidade associativa de um conceito e de uma imagem num primeiro sistema (língua), transforma-se em significante no segundo sistema.
p.136 “[...] as matérias primas da fala mítica (língua propriamente dita, fotografia, pintura, cartaz, rito, objeto, etc), por mais diferentes que sejam inicialmente, desde o momento em que são captadas pelo mito, reduzem-se a uma pura função significante: o mito vê nelas apenas uma mesma matéria- prima; a sua unidade provém do fato de serem todas reduzidas ao simples estatuto da linguagem. O termo final (totalidade dos signos) transforma-se em 1º termo ou termo parcial do sistema aumentado que ele constrói.” O mito incorpora dois sistemas semiológicos, um deslocado em relação ao outro. No sistema linguístico, a língua, linguagem-objeto, para Barthes, é a linguagem que o mito utiliza para construir seu sistema; o mito, meta-linguagem, porque é uma segunda língua que fala da primeira. Em decorrência, Barthes sinaliza que o semiólogo deve tratar da mesma maneira a escrita e a imagem: deve considerar que ambas são signos e chegam no limiar do mito por possuírem a mesma função significante = linguagem objeto.
EXEMPLO – p.138 -  capa  de um número da  revista Paris – Match : um negro  vestindo um uniforme do exército francês faz uma saudação militar, com olhos erguidos e fixos na bandeira tricolor – sentido da imagem. A imagem significa que a França é um forte Império e que seus filhos, sem distinção de cor, a respeitam  e adotam sua bandeira. A imagem é uma resposta aos críticos ao colonialismo. Exemplo de um sistema semiológico ampliado: há um significante formado por um sistema prévio = um soldado negro saúda a bandeira francesa; há um significado = misto de “francidade”/ “militaridade”   ; há uma  presença do significado através do significante.
TERMINOLOGIA -  significante no mito= termo final do sistema linguístico ou como termo final do sistema mítico.
No plano da língua – como termo final do 1º sistema – significante = sentido – um negro faz a saudação militar à bandeira tricolor francesa; no plano do mito= forma.
O significado é chamado – conceito – nos dois sistemas. O 3º termo = correlação dos dois primeiros: no sistema da língua= signo e no mito=significação, porque “o mito tem efetivamente uma dupla função: designa e notifica, faz compreender e impõe.”  

A  forma e o conceito p.139 -142

p. 139-140 - Significante no mito= apresenta simultaneamente sentido e forma, pleno de um lado e vazio de outro. A forma não suprime o sentido, empobrece-o, afasta-o, conservando à sua disposição. O sentido tem sua morte suspensa, conserva-se vivo no mito. A forma do mito não é símbolo ( retomando o exemplo – o negro da capa da Paris Match, não é cúmplice do conceito de imperialidade francesa e se constitui como uma presença emprestada, através do conceito, uma história nova é implantada no mito. Daí a característica fundamental do conceito mítico, que é o do ser apropriado. O conceito propicia que uma história nova seja incorporada no mito.

p.141 – O conceito  corresponde a uma função precisa e define-se como uma tendência, pois, um significado pode ter vários  significantes, como exemplo, é possível encontrar muitas imagens que signifiquem a imperialidade francesa. O conceito assim, é quantitativamente mais pobre do que o significante, se limita com frequência a re-apresentar-se.

p.142 – “O conceito é um elemento constituinte do mito: se pretendo decifrar mitos,
e necessário que possa nomear conceitos.” 
 
A significação p.142-148

p.143 A significação é própria do mito, pois o “mito não esconde nada” e tem a função de deformar. A deformação é possível porque a forma do mito já é constituída por um sentido linguístico. Num sistema simples como a língua, o significado não pode deformar nada, porque o significante é vazio, arbitrário, não lhe oferece nenhuma resistência. 

p.144 No mito o significante apresenta duas faces: uma plena, que é o sentido e uma vazia, que é a forma. Exemplo – (negro- soldado francês-saudando-a-bandeira-tricolor) – o conceito  deforma a face plena, o sentido – o negro é privado de sua história e transformado em gesto, ocorre uma deformação, o negro permanece, o conceito retira-lhe a memória, mas necessita dele.

p.144-145 O mito é um valor, não tem verdade com sanção: nada o impede  de ser um perpétuo álibi (termo espacial – há um lugar pleno e um lugar vazio, ligados por uma relação de identidade negativa: basta que o seu significante tenha duas faces para dispor sempre de um “outro lado”: o sentido existe sempre que apresentar a forma; a forma existe sempre para distanciar o sentido.
O caráter  do mito é imperativo e interpelatório, pois surge de um conceito histórico, vem diretamente da contingência, obriga o acolhimento de sua ambiguidade  expansiva, motivação (elemento da significação).

p.147  A significação mítica não é completamente arbitrária, é sempre em parte motivada, contém fatalmente  uma analogia : para que a imperialidade francesa se apodere do negro que faz a saudação militar do negro e a saudação militar do soldado francês. A motivação é necessária à própria duplicidade do mito; o mito joga com a analogia do sentido e da forma: não existe mito sem forma motivada.

p.148 O mito é um sistema ideográfico puro onde as formas  são ainda motivadas pelos conceitos que representam, sem no entanto cobrirem a totalidade representativa desse conceito.

Leitura e decifração do mito p.149-152

p.149 Barthes propõe três tipos diferentes de leitura semiológica do mito:
1- se focalizar o significante vazio – o conceito preenche a forma do mito sem ambiguidade, a significação volta a ser literal – o  negro que faz a saudação militar é um exemplo da imperialidade francesa, é o seu símbolo-  leitura cínica que destrói o mito .  
2- se focalizar o significante pleno, distinguindo plenamente o sentido da forma e, portanto, a deformação que um provoca no outro, é destruída a significação do mito – o negro que faz a saudação militar  transforma-se no álibi  da imperialidade francesa – focalização  do mitólogo que decifra o mito e compreende uma deformação- leitura desistificadora.
3-se focalizar o significante do mito, enquanto totalidade inextrincável de sentido e forma, a significação é ambígua  e ocorre uma leitura segundo a dinâmica própria do mito. O negro que faz a saudação militar passa a ser a própria presença da imperialidade francesa.  A focalização é dinâmica e o leitor vive o mito como uma história verdadeira e irreal.

p.151 O mito-  não é uma mentira nem uma confissão. É uma inflexão. É simultaneamente imperfectível e indiscutível: o tempo e o saber nada lhe podem acrescentar e subtrair.

p.152 O mito é lido inocentemente quando não é lido como um sistema semiológico, mas como um sistema indutivo, ou seja, quando há uma equivalência lê- se uma processo causal, no qual o significante e o significado mantêm relações naturais. Todo sistema semiológico é um sistema de valores.

Mito como linguagem roubada  p. 152-158

p.152  A função específica do mito é a de transformar um sentido em forma.
A língua oferece fraca resistência ao mito, pois ele pode desenvolver o seu esquema segundo, a partir de qualquer sentido, não importa qual, ou ainda a partir da própria privação de sentido.

p.153 – O mito nunca está no grau zero da língua.
  

 

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